Mais de 30 autarcas franceses, alguns nascidos em Portugal,
mas na sua maioria luso-descendentes, estiveram em Portugal entre 31 de Maio e
3 de Junho para cumprirem um programa de encontros com membros do Governo,
deputados e responsáveis de organismos ligados ao turismo e à cultura em Lisboa
e no Porto.
Os luso-eleitos foram recebidos em audiência pelo Presidente
da República e mantiveram reuniões com o Ministro dos Negócios Estrangeiros,
Luis Amado, e os secretários de estado das Comunidades, António Braga, do
Turismo, Bernardo Trindade, e da Cultura, Elísio Summavielle. Foram ainda
recebidos pelo embaixador da França em Portugal, Denis Delbourg,
num encontro centrado no tema dos laços entre os dois países e da promoção da
língua francesa em Portugal.
A audiência com o Presidente da República foi o primeiro compromisso do
programa da viagem. Os autarcas explicaram a Cavaco Silva que é preciso
reforçaras relações entre as câmaras municipais francesas e as autoridades
portuguesas - que consideram insuficientes. No final da audiência, em declarações à Lusa,
Hermano Sanches Ruivo, conselheiro na câmara de Paris, e um dos organizadores
da visita disse ser necessário haver "uma mensagem muito clara, de certa forma
de uma aceitação da parte portuguesa em dizer se nós, cidades francesas,
teremos uma resposta positiva das autoridades se quisermos ter uma participação
portuguesa mais consistente".
O autarca acrescentou que há "o sentimento de que não tem sido assim até o
momento" e sublinhou a necessidade "de melhorar esta presença de Portugal e
estreitar estas ligações", principalmente com as câmaras para as quais forem
eleitos luso-franceses.
Existem actualmente mais de três mil luso-eleitos em municípios
franceses.
"Embaixadores" de Portugal nas
câmaras
No dia 2 de Junho, os autarcas foram recebidos por deputados membros do Grupo
Parlamentar de Amizade Portugal-França, criado em Maio último e presidido por
Carlos Gonçalves. O deputado social-democrata eleito pelo círculo da Europa,
referiu que o Grupo, constituído por dez parlamentares, pretende ajudar a
"incrementar as relações entre Portugal e França". "Penso que do vosso lado os
objectivos são os mesmos, portanto, temos aqui uma plataforma de entendimento
que vai permitir trabalhar em conjunto", frisou Carlos Gonçalves, sublinhando
que independentemente de serem todos eleitos franceses, e de na larga maioria
serem também franceses, os autarcas que integram a delegação "têm também uma
ligação a Portugal". "Pelas funções que exercem em França, no fundo representam
também um pouco Portugal", acrescentou o parlamentar, para quem os cerca de 30
autarcas luso-franceses que vieram a Portugal são "os nossos «embaixadores» nas
diferentes câmaras, em cidades com densidade populacional elevada, e com capacidade
para implementar aquilo que chamamos a diplomacia autárquica".
Pedro Soares, do Bloco de Esquerda, destacou a presença na Assembleia da
República, daquela delegação de eleitos franceses "com tanta ligação à
comunidade portuguesa" e agradeceu o facto de falarem português e "manterem
alguma relação com a cultura portuguesa".
Telmo Correia, deputado do CDS-PP e um dos vice-presidentes do Grupo
Parlamentar de Amizade Portugal-França, afirmou que o conselho que Portugal e o
Parlamento têm para dar aos luso-descendentes, particularmente àqueles que
mantêm uma ligação a Portugal é "em primeiro lugar sejam bons franceses,
porque, num conceito de boa cidadania que é tão caro à própria sociedade
francesa, sendo bons cidadãos franceses, estão também a honrar as tradições dos
portugueses".
Perante os autarcas, o deputado considerou ser um estímulo a participação
destes na vida política, "enquanto cidadãos franceses", porque, acrescentou,
"será um contributo não só para a valorização da própria comunidade (portuguesa
em França), como também uma valorização da relação entre os dois países.
José Soeiro, destacou por sua vez, os inúmeros acordos de geminação assinados
com municípios franceses e lembrou que "há uma proximidade muito profunda entre
a França e Portugal", por diversas razões históricas. Por isso, afirmou, "há
naturalmente hoje uma forte comunidade luso-descendente em França". Sobre o
Grupo Parlamentar de Amizade Portugal-França, frisou que, independentemente da
cor partidária de cada um dos seus membros, tem como único objectivo
"aprofundar as relações entre Portugal e França e contribuir para o
aprofundamento dessas relações em todos os planos".
Relações devem passar pelas autarquias
Lembrando que luso-eleitos ali presentes eram representantes de cidades,
algumas com uma grande população, "e que têm uma ligação concreta a Portugal,
seja pelas geminações ou porque têm autarcas franceses de origem portuguesa,
Hermano Sanches Ruivo sublinhou o apelo às raízes portuguesas para no âmbito da
viagem "podermos trabalhar de uma forma muito concreta". "Essa é a principal
mensagem que queremos deixar: se cada vez mais acreditarmos que as relações
entre a França e Portugal se devem desenvolver, também acreditamos que vão
passar essencialmente pelas cidades", destacou o conselheiro na câmara de
Paris, que entretanto quis deixar presente o facto de serem todos cidadãos
franceses. "Agora, temos muito empenho numa ligação forte com a comunidade
portuguesa. Gostaríamos que estes contactos fossem muito mais regulares e de
trabalhar muito directamente com o Grupo Parlamentar de Amizade
Portugal-França", acrescentou.
Entretanto, o autarca frisou que no âmbito das ligações entre França e
Portugal, as imagens dos dois países têm que ser trabalhadas - "a de França em
Portugal e a imagem que se tem de Portugal em França". "E nós temos claramente
que trabalhar nesses dois eixos, na presença portuguesa em França, mas também
na presença francesa em Portugal", disse ainda.
Uma opinião partilhada por Ana Maria Torres, autarca em Bordéus, que afirmou
duvidar se "haverá realmente vontade de manter os laços com França",
acrescentando que "há muita falta de informações (sobre Portugal)", naquele
país. A autarca, que nasceu em Portugal, lamentou ainda o "isolamento que as
comunidades (portuguesas) sentem em relação a Portugal".
"O papel dos consulados não é exactamente aquele que deviria ser", acusou a
autarca, sublinhando que exercem "basicamente" um papel "administrativo", não
havendo "uma ligação próxima aos portugueses".
Luso-descendente, Nathalie de Oliveira destacou o número de luso-eleitos em
França e referiu que o seu trabalho prova ainda a participação política e
cívica dos portugueses nas cidades. Autarca em Metz, revelou que a primeira
comunidade europeia naquela cidade "é a portuguesa" e defendeu que o trabalho
para se mudar a imagem de Portugal em França "tem que ser feito em conjunto"
com as autoridades portuguesas.
Uma imagem que Alda Pereira Lemaítre, presidente da Câmara de Noisy le Sec,
lamenta ser ainda a de um Portugal de há 30 anos. "Parti para França aos três
anos, mas sou muito ligada à cultura portuguesa e descobri um Portugal
diferente", destacou a autarca, que afirmou ser necessário "encontrar uma forma
de valorizar o Portugal de hoje, de mostrar que Portugal actual é diferente" de
há 30 anos atrás.
Ana Grácio Pinto
apinto@mundoportugues.org
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