Já
numa crónica anterior falámos aqui um pouco da remota presença lusitana nestas
paragens. Fizemo-lo no entanto duma forma sucinta, não mencionando quaisquer
nomes, veridicos ou não, que estão indubitavelmente ligados à história
recente deste grande país, e cuja presença nestas paragens é anterior à
primeira grande vaga de imigrantes portugueses que chegaram no início dos anos
cinquenta do século XX, de forma organizada e controlada pelos dois governos,
português e canadiano.
De todos os casos de imigração individual de personagens que não fazem parte da
nossa memória colectiva começaria por mencionar o nome de Manuel da Costa, que
teria sido o primeiro português a estabelecer residência no Canadá e o primeiro
habitante negro a residir nestas paragens. No inicio do século XVII teria
servido de intérprete junto das populações nativas, ao serviço de Samuel de
Champlain.
Se a presença e origens de Manuel da Costa está envolta em algum mistério o
mesmo já não sucede com Pedro da Silva, conhecido por «le portugais», que viveu
entre 1647 e 1717 e é oficialmente considerado o primeiro carteiro canadiano.
Toda a correspondência entre Québec e Montreal nesta altura, era transportada
na sua canoa através do rio São Lourenço, e em 2003 os Correios Canadianos
emitiram um selo em
sua homenagem. Sabe-se pouco das origens de Pedro da Silva
(ou Pierre Dasylva) salvo que partiu de Portugal antes de 1673, aqui se casou
em 1677 e teve uma prole de 14 filhos, o que na altura era normal. Segundo o
recenseamento de 1677 vivia com a familia na cidade ribeirinha de Beauport e
trabalhava como mensageiro. Mudou-se depois para a parte baixa, na margem do
rio, da cidade de Québec e aqui, dedicava-se ao transporte de
mercadorias. Diz a lenda que, mesmo nos invernos mais frios, e com as águas do
rio completamente geladas acabava sempre por fazer o transporte dos seus
produtos entre as duas grandes cidades da Nova França. Segundo
documentos oficiais datados de 1693 recebia uma retribuição de 20 «sols»
(equivalente a uma libra) para transportar uma encomenda de Montreal até
Québec. A 23 de Dezembro de 1705 recebeu uma carta da comissão de
Jacques Raudot, intendente da Nova França, que lhe conferia o título de
«correio-mor» do Canadá. Estava assim autorizado a transportar cartas e
encomendas de particulares e oficiais no Canadá, que nesta altura e como país
organizado, era constituído sobretudo pela zona fluvial entre Montreal e o
Golfo do grande rio na península de Gaspé. O motivo do selo consagrado a
Pedro da Silva mostra-nos uma imagem de Québec executada por alturas de
1760, tendo gravadas as armas do rei de França, ornadas por um extrato da
carta da comissão oficial de Jacques Raudot e com a assinatura de Pedro da
Silva. Os nomes de Silva, Dasilva e Dasylva, são hoje apelidos comuns usados
por inúmeras familias canadianas que terão tido a sua origem neste aventureiro
português do século XVII.
Sem a importância deste nosso antepassado poderia ainda mencionar nomes como
Frank Silver (anglicismo de Francisco
Silva) importante pintor naif de Hantsport, província da Nova
Escócia, do século XIX.
No inicio do século XX e com o desenvolvimento da marinha mercante a
vapor muitos passageiros clandestinos ficavam nas províncias da costa
atlântica. Entre eles mencionaria um certo António da Silva que servia de elo
de ligação dos pescadores de bacalhau nos bancos da Terra Nova à sua terra
natal. Nas províncias do interior do país, citaria o nome de Eduardo António Alves que se
estabeleceu no sul do Ontário e se alistou no exército canadiano. Serviu o país
como soldado nas Primeira e Segunda Grandes Guerras Mundiais e foi
agraciado pelo governo português na primeira e pelo canadiano na segunda.
Além destes, um sem número de anónimos subiram até Dawson City, no território
de Yukon no século XIX, por alturas da febre do ouro, onde teriam
tentado a sua sorte nessas gélidas terras do Grande Norte
Canadiano. Todos estes individuos estão hoje completamente inseridos na
população canadiana e os seus descendentes tudo ignorarão sobre as suas
origens.
J.L.
Reboleira Alexandre
jose.alexandre@videotron.ca
Gazeta das Caldas, aqui.