Estima-se que todos os anos entre 70 a 75 mil portugueses procurem outros países para trabalhar. Na década de 60 emigravam perto de 80 mil.
São na maioria jovens, são na maioria homens. Mas já não vão com uma mala de cartão para França, nem morar nas ‘bidonvilles' ao redor de Paris. Os novos emigrantes portugueses sentem que Portugal é limitador. A todos os níveis. No desenvolvimento profissional e pessoal que lhes propõe. Nos limites salariais que lhes impõe. No emprego que pura e simplesmente não existe.
Nuno Oliveira sabe o que isso é. Hoje com 23 anos, Nuno vivia em Odeceixe, na costa vicentina do Algarve. E a dificuldade em arranjar trabalho levou-o a emigrar. Desde 2003, só da família de Nuno partiram dez pessoas para Inglaterra. Lá, casou-se e teve uma filha com uma portuguesa, Catarina, que também já era emigrante com os pais.
O perfil do emigrante português não é certo. Sabe-se apenas o que foi dito no início do artigo. Mas não se sabe que formação tem.
Há não muito tempo, Rui Pena Pires, coordenador do Observatório da Emigração, foi ao Parlamento dizer que um dos "equívocos que se criou" é o de que as pessoas que hoje mais emigram sejam qualificadas. De acordo com o Banco Mundial, 20% dos licenciados portugueses estariam fora do País. Mas o responsável afirma que é preciso "ter cuidado" com estes dados.
Talvez por serem mais facilmente contactáveis, a maioria das pessoas com quem o Diário Económico conseguiu falar não têm um perfil idêntico ao de Nuno Oliveira, que trabalha como operador de máquinas. Ou como o de Vasco Linhares, 37 anos, que foi trabalhar para uma empresa portuguesa em Angola em 2007 porque tinha dificuldade em pagar as contas da família.
Os contactados são, na sua maioria, licenciados. E nem sempre os licenciados vão para fora por razões económicas. Como refere Maria Neiva, que escreve no blogue Mind this Gap (Graduados Abandonam Portugal), há várias razões: " necessidade aliada à vontade de alargar horizontes, pela aventura, outros porque se chateiam com o país".
Mesmo os dados sobre o número de pessoas que todos os anos emigram para fora do País são discrepantes entre entidades como o INE e os dados recolhidos, por exemplo, pelo Observatório da Emigração.
Em média, estimava Rui Pena Pires na mesma ocasião, 70 a 75 mil portugueses emigram todos os anos. Mas o número tem vindo a desacelerar com a crise. O número aproximar-se-á assim da época "dourada" da emigração, nos anos 60, quando emigravam anualmente 80 mil portugueses.
Histórias de pessoas que não quiseram (nem puderam) ficar em Portugal
André Policiano, 35 anos. Desde 2007 em Angola.
Cansado
da falta de "estímulo intelectual" que tinha na PME onde colaborava,
André Policiano, lisboeta hoje com 35 anos, foi em 2007 para uma
multinacional em Luanda. Hoje, já está num segundo projecto, "talvez o
mais difícil" da sua carreira. Em Angola, para onde foi ganhar bastante
mais que em Portugal como gestor de projecto, o risco é constante. Por
isso, defende: interiorizar o risco" no quotidiano é condição de
sucesso empresarial".
Catarina Correia 25 anos. Desde 2006 em Inglaterra
Catarina
Correia começou por ir, ainda menor, para a Alemanha, na companhia dos
pais. Mas em 2006 foi ter com o namorado, como ela, natural da vila de
Odeceixe, vila litoral na costa vicentina algarvia. Emigrou com os pais
por ser menor, mas também "porque já havia falta de trabalho na nossa
zona". Hoje, Catarina trabalha como ‘baby sitter', além de tomar conta
da sua própria filha de quatro anos de idade.
Hugo Cardoso, 35 anos. Desde 2009 na Noruega
Descontente
com a evolução da sua carreira, Hugo Cardoso, engenheiro, comprou um
bilhete de ida para a Escócia depois de se despedir da empresa onde
trabalhou durante 11 anos. Sentia-se explorado, não vendo qualquer
"evolução profissional, nem tão-pouco ao nível salarial", conta.
Preocupado com o futuro do seu filho e com o actual estado económico de
Portugal, Hugo Cardoso decidiu deixar tudo e está agora na Statoil, na
Noruega, onde já estão a sua mulher e o seu filho.
João Grilo, 31 anos. Desde 2003 no Reino Unido e Austrália
Licenciado
em Enfermagem, João Grilo foi primeiro para o Reino-Unido e agora está
algures na ilha-continente da Austrália. Afirma que foi o seu "gosto
pela aventura" a levá-lo tão longe. Mas tem consciência que as
oportunidades são poucas em Portugal. "Se Portugal pouco oferecia
quando rumei ao Reino Unido em 2003 hoje ainda menos oferece", diz,
concluíndo: "por ora manter-me-ei como espectador do triste filme que
por terras lusas vai rolando".
Maria João Catarino, 26 anos. Desde Outubro de 2010 no Qatar
Maria
João, 26 anos, estava a trabalhar num banco em Lisboa, com contratos a
termo. Insatisfeita, começou a procurar alternativas. E assim surgiu a
hipótese de rumar a Doha, no Qatar, para uma companhia aérea. Maria
João não é parca nas palavras para explicar por que o fez: "é uma
segunda oportunidade". E assim, pelo menos, "voltei a acreditar no
reconhecimento humano e profissional e sempre viajo e conheço o mundo!"
Miguel Machado, 31 anos. Desde Setembro em França
Com
31 anos, Miguel Machado foi em Setembro para Paris. Licenciado em
Sociologia, em Portugal nunca trabalhou na sua área, tendo passado pela
banca e pelo ‘backoffice' de uma empresa de segurança privada. Com a
namorada a dar aulas em Paris, a decisão foi óbvia. Está há um mês e
ainda não arranjou emprego, mas tem ido a várias entrevistas. Não sabe
quanto tempo vai ficar, mas "se aparecesse a hipótese de voltar a
Lisboa com estabilidade laboral para ambos, essa seria a opção a tomar".
Nuno Oliveira, 23 anos. Desde 2003 em Inglaterra
Nuno
Oliveira, 23 anos, foi para Inglaterra em 2003, com os seus pais. Hoje,
é operador de máquinas numa empresa onde se processam hologramas para
passaportes ou notas de bancos no Reino Unido. "Quando vamos de férias
pensam que vamos ricos, mas so nós sabemos o que aqui trabalhamos para
ter uma vida melhor, e infelizmente aqui a crise também chegou, muitas
companhias estao a fechar, a falta de trabalho também já se nota".
Paula Medeiros, 29 anos. Desde Outubro no Canadá
Está
a fazer um ‘part time' numa sapataria em Toronto, Canadá, mas mesmo
assim ganha mais do que como assistente social em Ponta Delgada. "Para
conseguir pagar a casa, as contas de casa, o carro e comer tinha de
saber poupar muito bem". E quando lhe foi apresentado um orçamento de 6
mil euros para fazer uma operação ocular, achou que tinha de melhorar
de vida. Foi ao Canadá e em duas semanas arranjou trabalho.
Sylvia Vaz, 40 anos. Desde 2007 em Moçambique
Sylvia
Vaz, 40 anos, estava cansada de não poder ser dinâmica nem ter espírito
de iniciativa na função pública, onde estava desde 1993. Depois de
quase nove anos sem concursos ou progressão na carreira, em Maio de
2007 emigrou para Moçambique. Divorciada, mãe de dois filhos, faz um
balanço positivo da sua decisão. "Encontro oportunidades em Moçambique
que dificilmente encontraria em Portugal".
Teresa Barbosa, 32 anos. Desde 2003 na Irlanda
Tudo
comecou com um estágio profissional de seis meses em Dublin através do
Programa InovContacto. Quando terminou o estágio, a empresa
ofereceu-lhe emprego e Teresa regressou. Foi pela experiência
profissional, mas também pelas condições de vida que afirma ter na
Irlanda e pela sua "multiculturalidade". Formada em Economia, hoje está
na Google, numa equipa de engenheiros e linguistas na detecção de
conteúdo "sensível".
Económico, aqui.