Quando em Maio deste ano esteve em Portugal, apara o lançamento do seu mais recente livro «Portugal na Hora da Verdade», Álvaro Santos Pereira concedeu uma longa entrevista a O Emigrante/Mundo Português onde falou de finanças públicas, dívida externa, investimento e exportação, mas também de natalidade, emigração, agricultura e retoma do crescimento.
Para o então economista e professor de Política Económica e de Desenvolvimento Económico na Simon Fraser University, em Vancouver, Canadá, o processo de agravamento da situação económica portuguesa começou "há cerca de 15 anos" e deteriorou-se "na última década".
As causas? Várias, entre as quais o "despesismo", a "falta de cuidado com a situação orçamental do país". "Pensar que por estarmos integradas numa união monetária poderíamos aumentar as dívidas porque mais cedo ou mais tarde, alguém nos iria ajudar. Foi uma estratégia totalmente errada", afirmava a este jornal.
O que fazer, onde cortar? O agora ministro da Economia e do Emprego defendia cortes na «máquina» do Estado, principalmente nos institutos, organismos e entidades públicas. "É muito importante que consigamos diminuir a despesa do Estado e reestruturá-lo. Principalmente cortar em institutos, organismos e entidades públicas para que não tenhamos que sacrificar ainda mais as famílias, os funcionários públicos e as empresas. Porque senão, nunca mais saímos desta crise. O despesismo do Estado também é culpa nossa, mas é principalmente culpa dos nossos governantes. Quanto a mim, tem que ser o Estado a pagar pela crise, a maior factura não tem que ser apresentada nem às famílias nem às empresas".
Fim do "compadrio"
Quanto a uma política de privatizações, afirmou que estas seriam "inevitáveis", mas deixando de parte "alguns activos" como a Caixa Geral de Depósitos, explicando que uma privatização da CGD neste momento significaria uma venda "ao desbarato".
Favorável ao fim das nomeações políticas nas empresas públicas, Álvaro Santos Pereira concorda com a existência de "alguns cargos de confiança política" no topo da hierarquia da empresa mas defendeu que "o principal critério de ascensão a posições de liderança deve ser o mérito, não por partidarismos ou por se ter o cartão do partido".
"É preciso moralizar a vida pública. Tem que haver transparência, auditorias externas regulares, mas é preciso haver - e isso é urgente - uma delimitação muito clara daquilo que são cargos políticos e o que são cargos públicos", alertava.
O economista afirmava ainda que uma das apostas do novo Governo deveria ser feita nas exportações, acrescentando que Portugal exporta "muito pouco", em percentagem do PIB. E defendia que o problema não está tanto no pouco apoio às empresas exportadoras, mas o facto de ir para "as empresas protegidas", algo, que, segundo o agora ministro "tem que ser invertido".
"Em vez de dar incentivos às empresas que têm interesses instalados, temos que os dar às empresas que inovam e que exportam. Há empresas que o fazem e com imenso sucesso e no que os governantes podem ajudar é a dar-lhes incentivos: reduzir a Taxa Social Única, baixar os impostos que pagam se apostarem nos sectores de internacionalização em vez de olharem apenas para o mercado interno", explicava.
Outra questão que defendeu na entrevista a este jornal, foi um maior aposta na Emigração portuguesa, um "bem" que afirmava não estar a ser aproveitado". "Era importante que conseguíssemos atrair muito emigrantes, aumentar-lhes as condições, para virem reformar-se a Portugal. Porque as reformas virão para Portugal, como as remessas", explicava acrescentando que os incentivos deveriam ser alargados a portugueses e luso-descendentes que queiram investir em Portugal. "Nós não temos feito nada para atrair de volta esses emigrantes, assim como os luso-descendentes, e essa tem que ser uma das prioridades para os próximos anos. Nós não temos que atrair cinco milhões de pessoas para Portugal, mas se conseguíssemos atrair 0,1 por cento dessas pessoas, seria suficiente para alterarmos alguma coisa no estado do país", afirmava.
Quanto às medidas urgentes de combate à crise, a tomar por um novo Governo, Álvaro Santos Pereira defendia em primeiro lugar, "uma política de transparência e anti-corrupção" que acabe com o "clima de suspeição" que existe actualmente em relação aos governantes. Depois, disse ser importante, uma "política sem tréguas, de combate ao endividamento", apoiada no estímulo à poupança, na diminuição da dependência do exterior e da consequente importação de produtos e no pagamento das "nossas dívidas". O desenvolvimento passará, segundo o agora ministro, pela conjugação de medidas de austeridade com políticas de crescimento. E como se faz? "Podemos aumentar o IVA em um por cento, mas baixar consideravelmente a Taxa Social Única porque assim os custos do trabalho baixam, não teremos que cortar salários, as empresas tornam-se mais competitivas e criam mais empregos e consequentemente diminui o desemprego", explicou.
Por último, questionado por último sobre a possibilidade de integrar a equipa do próximo Governo, Álvaro Santos Pereira respondeu há dois meses atrás com um "depende". E explicou porquê. "Preferia voltar para trabalhar numa universidade. Mas nós devemos estar sempre dispostos a servir o nosso país. Se acontecesse, dependeria do cargo, da área e se o projecto envolvido estivesse de acordo com o que penso que deve ser feito para o país. Se o projecto prever manter o estado actual e não fazer uma verdadeira transformação das políticas económicas, eu não estou interessado".
Porque ficou «alerta» para as questões da emigração?
Sai de Portugal em 1994, para estudar na Inglaterra. Na altura era raríssimo encontrar um português. Fiquei na Inglaterra até 1998 e fui depois para o Canadá, onde vive uma grande comunidade de portugueses, na maior parte pessoas que foram há 40, 50 anos.
Quando regressei à Inglaterra para dar aulas, entre 2004 e 2007, já comecei a ver muito mais portugueses. Foi quando percebi que havia uma nova vaga emigratória em Portugal. Em 2009 voltei a Inglaterra, em visita, fui para a zona de York e a Leeds, e fiquei espantado com a quantidade de portugueses. Disseram-me que havia ali cerca de dez a 15 mil pessoas de origem portuguesa - quando três anos antes, era raro encontrar portugueses em Leeds. Foi o que me chamou a atenção para o fenómeno da emigração que estava novamente a acontecer. Fui pesquisar as estatísticas divulgadas pelos países de destino para perceber quantos portugueses estavam emigrados. Fiquei espantadíssimo com os números. Só para Suíça, nos últimos sete anos, até 2009, emigraram 70 mil portugueses.
E (a emigração) já está a começar a aumentar no Canadá, apesar de ser ainda muito pouco. Neste momento estamos com valores historicamente baixos no Canadá, mas estes estão a começar a subir novamente. Para entrar no Canadá precisa ter um alto nível de qualificação e o processo de entrada no país demora dois a três anos, enquanto para outros países da Europa não é preciso esperar. Mas já houve advogados de emigração canadianos a perguntar-me se conhecia pessoas qualificadas, interessadas em emigrar.
Na entrevista a «O Emigrante/Mundo Português» publicada na edição de 27 de Maio de 2011
Ana Grácio Pinto
apinto@mundoportugues.org
Mundo Português, aqui.