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Trabalhadores consulares na Suíça dizem que a situação é de “mera sobrevivência”
2012-11-09
As perdas cambiais sofridas pelos trabalhadores dos consulados portugueses na Suíça originaram um manifesto, enviado no mês passado, ao Governo e ao Presidente da República. No documento, os funcionários afirmam ser “humanamente impossível” suportar a carga fiscal anunciada para o próximo ano e sublinham que a sua situação atual é de “mera sobrevivência”.

No manifesto, os trabalhadores consulares queixam por o Governo, através do Ministério dos Negócios Estrangeiros, não ter ainda resolvido "a problemática das perdas cambiais" de 20,25% resultante da "elevada desvalorização do euro em relação ao franco suíço", a que se juntam desde 2010 os cortes salariais "na ordem dos 10%" e suspensão dos subsídios de férias e de Natal, decretados para a generalidade dos trabalhadores da função pública.
No mesmo documento, alertam ainda para o que dizem ser o "brutal aumento fiscal anunciado para 2013", afirmando não poderem suportar uma maior carga fiscal "tendo em conta que estão a viver e trabalhar num país e cidades que figuram entre os primeiros mais caros do mundo".
"A situação atual dos funcionários é de mera sobrevivência. Muitos têm que escolher entre pagar renda e casa ou ter dinheiro para a alimentação", afirmam ainda no manifesto.

Familiares a ajudar

Um dos motivos do manifesto é a contínua desvalorização do euro frente ao franco suíço. Por serem pagos em euro, os vencimentos dos trabalhadores consulares portugueses naquele país sofreram uma queda. O salário mínimo na Suíça ronda os 3.500 francos suíços (cerca de 2.900 euros).
Marco Martins, assistente administrativo na embaixada de Portugal em Berna, estima que os funcionários dos consulados portugueses na Suíça estejam a receber entre 2.900 (salário de um assistente administrativo) e 3.500 euros líquidos e diz que há casos de perdas salariais na ordem dos 33%.
"Tudo aquilo que for inferior a 4000 francos, corresponde na Suíça, ao que será o salário mínimo em Portugal", disse Marco Martins ao MUNDO PORTUGUÊS, acrescentando que a legislação que rege a relação laboral dos funcionários consulares refere o princípio da equidade. "O Decreto-Lei 444/99 (que aprova o estatuto do pessoal dos serviços externos do Ministério dos Negócios Estrangeiros) diz que os nossos salários devem ser criados com base em dois princípios: a equidade interna e a externa, que está a ser desrespeitada", afirma Marco Martins, que em janeiro do próximo ano completa 16 anos como funcionário consular na Suíça.
Marco Martins revela que, por conta das perdas cambiais, a "quase generalidade" dos funcionários está "a passar dificuldades", revelando o caso de um funcionário "que abandonou a carreira" e outro que pediu licença sem vencimento. "Há pessoas, com mais idade, que estão a recorrer a familiares para conseguir fazer face às despesas", disse ainda, adiantando que há funcionários consulares com segundos empregos e "a trabalhar 60/70 horas por semana".
Marco Martins, que vive com a mulher e dois filhos, dá como exemplo os gastos de uma família de quatro pessoas. "Uma renda de casa é de no mínimo 2000 francos suíços, o seguro de doença para quatro pessoas ronda os 1000 francos e a alimentação outros mil. Um quilo de carne e vaca custa 20 francos e de carne de porco, custa 15 francos. Acrescem ainda os gastos com água, luz, etc", afirma.
Depois da greve de cinco semanas para pressionar o Governo a encontrar uma solução, feita há um ano atrás, e que não resolveu o problema, Marco Martins diz que não têm "outra forma de luta, para além de alertar as autoridades e a sociedade". Alerta ainda no acréscimo do trabalho nos consulados, por conta do aumento do número de portugueses a emigrarem para a Suíça e sublinha que são os funcionários consulares quem "fazem movimentar o trabalho consular".
Há atualmente cerca e 50 funcionários consulares portugueses a trabalhar na Suíça, distribuídos pela embaixada em Berna, consulados gerais em Genebra e Zurique, escritórios consulares em Sion e Lugano e representação permanente nas Nações Unidas em Genebra.
Mário Silva, funcionário na Missão de Portugal junto da ONU, em Genebra, diz que é "a primeira vez" que está a passar por uma situação difícil. A trabalhar na Suíça há duas décadas, diz que recebia 3.500 francos suíços há 20 anos atrás, o equivalente a 2.901 euros atuais. "Nessa altura, uma renda de casa rondava o equivalente a 600 euros e o seguro de doença custava 40 euros", recorda, acrescentando que atualmente, o seu salário é de 2.682 euros líquidos (cerca e 3.200 francos suíços).
"Hoje pago 2.136 euros de renda de cada e um seguro de doença custa 350 euros por mês. Pago 150 euros por mês de luz e entre 350 a 400 francos no supermercado por semana e para gastar apenas esse valor tenho que dar um pulo a França, onde compro mais barato. O meu salário não chega", revela Mário Silva, que vive com a mulher em Genebra.
O funcionário consular diz que entre cortes e desvalorizações de moeda perdeu cerca de 32% do salário e acrescenta que, com estas perdas, não sabe "como ninguém ainda se suicidou", lembrando que por serem funcionários do Governo português, não têm acesso aos apoios dados pelo governo suíço.
"Há famílias monoparentais com muitas dificuldades", revela, citando o caso de uma funcionária consular, com dois filhos, que "não consegue aguentar-se e tem recebido ajuda". Mário Silva defende que o Governo português deve "olhar às especificidades de cada país, porque as situações não são iguais" e diz temer quanto irá perder a partir de janeiro, tendo em conta os impostos anunciados para o orçamento de estado de 2013, nomeadamente a sobretaxa de 4 por cento.
"Não sei o que vou fazer, tenho andado com a cabeça à roda a tentar prever quanto vai sobrar em janeiro. Pelas minhas contas, vou ser penalizado em 150 euros por mês. Não vejo luz ao fundo do túnel e esta gente está a entrar em depressão", afirma.
Ana Grácio Pinto
apinto@mundoportugues.org

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