Por Vanessa Cruz
Quando emigrou da primeira vez, dos Açores para Coimbra. Foi um
«estágio» para os anos que se seguiram, primeiro em Paris, agora em
Londres. Lara Silveira tem 25 anos, sempre teve trabalho em Portugal,
mas nem sempre remunerado à altura. Tem o coração aqui, mas gosta de
viver lá fora. «Ninguém me obrigou a sair, mas ninguém me deu razões
para ficar». O testemunho:
«Sou emigrante desde os 18 anos.
Açoriana de coração, Portuguesa de bilhete de identidade, deixei a minha
casa há 7 anos para me licenciar em Estudos Artísticos pela
Universidade de Coimbra.
Foi a primeira vez que vivi fora de
casa. Foi a primeira vez que vivi no continente. Para lá chegar, tinha
de apanhar dois voos num total de 2h30 até Lisboa, onde tinha de apanhar
o autocarro (muitas vezes a correr) para Coimbra. Os meus pais vieram trazer-me à universidade e deixaram-me com quarto e tudo o que precisava para não sentir muitas saudades de casa. Ainda que não tivesse mudado de país, sentia-me uma emigrante por ter um mar a separar-me da casa onde nasci e por não poder ir passar o fim de semana a casa como tantos dos meus amigos faziam.
Claro que a palavra emigrante não me passou pela cabeça na altura mas estar assim longe de casa foi
crucial para a pessoa que sou hoje e foi uma espécie de estágio para os
anos que se seguiram.
Findo o curso, rumei a Lisboa para viver e
tirar mestrado. Entretanto, comecei a trabalhar como assistente de
produção na companhia de teatro Colectivo 84 e tinha como part-time o
Call Center. Tinha de ter um trabalho que me pagasse e que me permitisse
tempo para estudar e trabalhar naquilo que gostava como era a produção
de teatro.
Nunca me faltou trabalho em Portugal. Nunca
tive de mostrar o meu currículo com todos os cursos e formações que
tirei para arranjar trabalho, mas também trabalhei muito sem que
tivessem como me pagar.
Em finais de 2010, candidatei-me ao
programa de estágios da União Europeia - Eurodysée. Este programa com
mais de 20 anos de existência, permite a jovens de diferentes regiões da
Europa se deslocarem entre estas e de estagiarem na sua área de
formação durante um período mínimo de 6 meses com tudo pago. Em
Portugal, apenas a região dos Açores e Madeira participam neste programa
e depois de ter falhado o concurso InovArte este era o meu plano B.
Em Janeiro de 2011 deixei Portugal.
Mudei-me para Paris sob a alçada do Eurodyssée para estagiar em
produção de teatro. Ainda que o gabinete de apoio em Paris me tivesse
dado alojamento, me tivesse pago a viagem, o curso de língua e salário,
as dificuldades para arranjar estágio foram muitas. Estive um mês e meio
à procura entre entrevistas numa língua que não dominava e respostas
negativas à minha candidatura. Foi preciso ter estômago forte para me
adaptar e foi preciso contar com o apoio dos pais e de velhos e novos
amigos.
Finalmente, consegui um estágio, que se tornou em
contrato de trabalho, como assistente de comunicação numa agência de
música ¿ La Bise Fraîche. A minha então chefe Maud Cittone acolheu-me de
braços abertos e teve uma paciência enorme para me ensinar o francês.
Hoje falo a língua fluentemente graças a este trabalho e graças às horas
de almoço em que eu passava a ler o jornal em voz alta para ela me
corrigir o sotaque.
A palavra emigrante pesou-me pela primeira vez quando comecei a ouvir piadas referentes aos portugueses emigrados em França desde o tempo dos meus avós. Percebi que era emigrante quando comecei a
pagar impostos (muitos) e quando recebi muitos apoios financeiros que
me eram devidos apenas porque sou cidadã da União Europeia. Percebi que
era emigrante quando comecei a procurar produtos portugueses no
supermercado e quando sorria ao ouvir português na rua.
Continue a ler o testemunho de Lara aqui
tvi24, aqui.