Reportagem de Daniel Rosário
O Governo belga aprovou esta quinta-feira um plano de acção contra a
utilização abusiva do mecanismo europeu de destacamento de trabalhadores
estrangeiros, tendo o primeiro-ministro, Elio Di Rupo, dado como um
exemplo "totalmente inaceitável" o caso de portugueses pagos a 2,06
euros à hora.
"Na semana passada, um empregador foi alvo de um
processo verbal, já que fazia trabalhar 60 não belgas, no caso
portugueses, por um salário de 2,06 euros à hora. Isso é totalmente,
totalmente, totalmente inaceitável", comentou esta quinta-feira Elio Di
Rupo, citado pela agência AFP, por ocasião da apresentação do plano de
acção contra o "dumping social".
Os 2,06 euros por hora resultam
num salário mensal de 346 euros, isto se forem consideradas oito horas
de trabalho nos 21 dias úteis de Novembro. Trata-se de um vencimento
inferior ao salário mínimo português, actualmente nos 485 euros brutos, e
muito abaixo do salário mínimo belga, que é de 1.502 euros ilíquidos.
O
mecanismo europeu de destacamento de trabalhadores estrangeiros em
causa permite que os encargos fiscais e sociais com estes trabalhadores
continuem a ser pagos no país de origem, neste caso Portugal, onde as
prestações são substancialmente inferiores às praticadas na Bélgica.
Isto permite às empresas que contratam em Portugal oferecer preços mais
baixos que os praticados pela concorrência na Bélgica.
Elio Di
Rupo garantiu que a Bélgica não coloca minimamente em causa a livre
circulação, reconhecendo as "numerosas vantagens" deste princípio, mas
indicou que o Governo vai combater os abusos - a maior parte dos quais
no sector da construção civil, mas também, por exemplo, da limpeza e
transporte rodoviário -, pois, sustentou, este "dumping social" - com a
prática de salários extremamente baixos, muito abaixo do salário mínimo
belga - ameaça a actividade das empresas belgas.
Apesar de a
Bélgica apoiar uma acção ao nível europeu - a abordagem que, de resto, é
defendida pela Comissão Europeia -, o Governo belga indicou esta
quinta-feira que não vai esperar mais tempo por uma iniciativa europeia,
pois tem de proteger a sua economia, razão pela qual adoptou um plano
de acção que prevê, entre outras medidas, um reforço dos controlos no
terreno por inspectores especializados e multas mais pesadas.
Nos
últimos meses têm surgido várias denúncias de casos de portugueses a
trabalhar em vários países europeus a receber salários extremamente
baixos ou com salários em atraso. Em Julho, houve denúncias de que um
grupo de 106 portugueses que foram contratados para trabalhar numa obra
em Birmingham, Inglaterra, tendo-lhes sido prometido um salário de 3.500
euros mensais. Mas acabaram por não receber o dinheiro prometido e a
maioria regressou.
Mas não foi só no Reino Unido que este tipo
de situações aconteceu. Também do Luxemburgo, da Bélgica, da Alemanha,
da França e do Canadá chegam denúncias de trabalhadores que têm
ordenados em atraso.
O consulado português em Bruxelas diz não ter conhecimento da situação referida pelo chefe do Governo belga.
Consulado não sabe de nada. Empresários dizem que é comum
O
consulado português em Bruxelas diz não ter conhecimento da situação
referida pelo chefe do Governo belga. A Renascença contactou empresários
portugueses ligados à actividade de angariação de trabalhadores e, sem
nunca se referirem a casos concretos, explicaram que esta situação é
comum, mas que na realidade os salários auferidos pelos trabalhadores
são muito superiores aos pouco mais de 2 euros referidos.
Isto
porque estes valores entre os 2 e os 3 euros por hora são os valores
legais e declarados sobre os quais incidem as despesas fiscais e com a
segurança social, pagos em Portugal. Este montante é depois
complementado por ajudas de custo, isentas de impostos, que fazem com
que o rendimento mensal ascenda a valores próximos dos 2 mil euros.
Certo
é que as autoridades belgas não estão pelos ajustes com estas práticas
que consideram ser um abuso das facilidades concedidas pela legislação
europeia.
Rádio Renascença, aqui.