A redução da presença norte-americana nas Lajes pode provocar a emigração de cinco a dez mil pessoas na ilha Terceira num curto período de tempo se não se criarem alternativas de emprego, segundo estudos da Universidade dos Açores.
"Isto obriga, dentro das estimativas, a uma emigração de 5500 pessoas, dentro das expectativas melhores, ou de dez mil pessoas, se de facto houver muito emprego informal actualmente", adiantou Tomaz Dentinho, economista e docente da Universidade dos Açores.
Segundo o professor, foram realizados até ao momento três estudos pela academia açoriana, dois coordenados pelo próprio, num modelo de interacção espacial, e um por Mário Fortuna, num modelo de equilíbrio geral.
O estudo do economista Mário Fortuna aponta para uma quebra no Produto Interno Bruto (PIB) da ilha Terceira na ordem dos 8,8%, enquanto os de Tomaz Dentinho estimam um impacto entre 10 a 12% do PIB. Nestes três casos é considerado apenas o "emprego formal".
As estimativas passam para o dobro se for tido em conta também o emprego indirecto que se gera com a Base das Lajes, em que as pessoas não descontam para a Segurança Social e não estão inscritas em centros de emprego.
Numa ilha com 55 mil habitantes, a emigração de cinco a 10 mil corresponderá a uma redução de 10 a 20% da população da ilha, o que, segundo o economista, terá um efeito multiplicador, tendo em conta que uma população menor não terá uma classe empresarial com capacidade para reagir e arrisca-se a perder algumas valências e actividades.
Para Tomaz Dentinho, perante a redução militar norte-americana nas Lajes, e se não forem criadas alternativas, as pessoas ou vão ficar na miséria ou vão emigrar, o que é possível que aconteça, tendo em conta o historial de emigração de açorianos para os Estados Unidos da América e Canadá.
"O ritmo a que isto acontece depende muito de haver possibilidade de emprego fora e também do ritmo do sistema de apoio que houver. Agora, num prazo de 10 ou de cinco anos, conforme estas atenuantes, a população da ilha Terceira passará eventualmente a ser 10 a 20% menor", frisou.
O economista defendeu que é possível travar este cenário arranjando alternativas de emprego na ilha, mas para isso considerou que é necessário renegociar o Acordo de Cooperação e Defesa entre Portugal e os Estados Unidos, que tem, por exemplo, "muitas restrições ao tráfego civil".
"É preciso alguma criatividade, atrair investimento e acabar com regras que limitam esse investimento", salientou. Tomaz Dentinho sugeriu como exemplo a utilização da Base das Lajes para fins civis e a atracção de companhias áreas de baixo custo para a ilha Terceira.
Também o Porto da Praia da Vitória, que se encontra perto da base, pode ser potenciado, segundo o economista, mas para isso é preciso existir concorrência entre os diferentes portos dos Açores. "O facto de existir uma entidade portuária comum à região faz com que os portos não compitam entre si, portanto, naturalmente, a Terceira pode ficar sempre abaixo ou acima de uma decisão qualquer que favorece um outro porto", justificou.
Desde o fim da Guerra Fria que o número de trabalhadores portugueses na Base das Lajes tem vindo a cair, mas sempre de forma gradual e nunca com a dimensão prevista para este ano, incluindo também o trabalho indirecto. Até ao Outono, os Estados Unidos pretendem reduzir os actuais 803 trabalhadores portugueses para um máximo de 370, mas as estimativas de sindicatos e autarquias apontam para a perda de 1500 postos de trabalho, quando contabilizado também os empregos indirectos.
Por outro lado, o plano dos Estados Unidos para a utilização de infra-estruturas das Lajes, após o processo de reestruturação pode condicionar a utilização civil do espaço se o Estado português não impuser condições, segundo alertam os trabalhadores portugueses da base.
"Do conhecimento que temos em termos de infra-estruturas, não estamos a ver os americanos a concentrarem-se numa pequena área geográfica da base. O que nós vemos é que eles mantêm a utilização de um edifício num determinado ponto, um outro edifício num outro ponto qualquer...", frisou João Ormonde, da Comissão Representativa dos Trabalhadores portugueses na Base das Lajes (CRT), admitindo que isso possa "condicionar a utilização do Estado português do espaço e das infra-estruturas sobrantes".
Qualquer intervenção nas infra-estruturas na base das Lajes, sejam obras de remodelação ou a demolição de edifícios, exige autorização do Ministério da Defesa português, ao abrigo do Acordo de Cooperação e Defesa entre Portugal e os Estados Unidos.
No entanto, os trabalhadores temem que a escolha dos edifícios que os Estados Unidos pretendem manter ou dispensar possa ser feita de forma unilateral, à semelhança do que foi anunciado para a parte laboral.
"A questão não foi colocada como um plano concertado e isso retira à parte portuguesa a oportunidade de participar nesse próprio plano. São os americanos que ditam unilateralmente quais são as infra-estruturas que querem e não querem e resta a Portugal ficar com aquilo que os americanos não querem", alertou o membro da CRT.
Para João Ormonde, a reestruturação da base "nunca pode ser feita sem ser negociada ponto a ponto com o Estado português, quer em matéria laboral, quer em matéria de infra-estruturas".
Com a redução da presença norte-americana, as infra-estruturas que deixam de ser utilizadas pela Força Aérea dos Estados Unidos terão de ser cedidas ao Estado português ou demolidas, no entanto, Roberto Monteiro, presidente da Câmara Municipal da Praia da Vitória, alertou para a necessidade de avaliar a utilidade dos edifícios.
Para o autarca, as infra-estruturas que estão dentro da base "só deverão ser recebidas caso existam projectos objectivos e identificados que sejam reprodutivos na perspectiva de criar emprego sustentável e riqueza", já que são "quantificadas como contrapartida".
"Não há aqui a ilusão de que o património é entregue a título gratuito", sublinhou. Dentro da base, os norte-americanos deverão adaptar camaratas para os 165 militares norte-americanos que continuarão destacados na Terceira com comissões de um ano e sem direito ao acompanhamento de familiares. No entanto, fora do perímetro da base, os Estados Unidos construíram cerca de 600 apartamentos que deixarão de ter utilidade.
O destino destes apartamentos ainda não está claro, segundo Roberto Monteiro, mas existe a possibilidade de serem cedidos ou afectados ao Governo Regional dos Açores ou ao município, em caso de devolução ao Estado português. Para o autarca da Praia da Vitória, se o património mobiliário habitacional for recebido pelo Estado deve ser utilizado na criação de um "programa especial de orientação para jovens casais".
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