Vieram da Namíbia, de África do Sul, dos Estados Unidos, do Reino Unido. Nos corredores de um hotel em Lisboa, onde decorreu este fim-de-semana uma feira de emprego exclusiva para os angolanos na diáspora, os candidatos ajeitam as gravatas, preparam-se para as entrevistas, revêem currículos.
São jovens licenciados e, como Keila Magalhães, têm a mala pronta para regressar a Angola. "Se tivesse uma oportunidade não hesitava. Regressar sempre foi um desejo meu", diz a estudante de Gestão de 24 anos, que está em Lisboa desde os 14. William Garcia, que nunca tinha estado em Portugal, também tentou a sorte. Aos 22 anos, e a viver em Londres há dez, tenciona fazer carreira como engenheiro informático no país de origem. "Já tenho uma entrevista marcada", disse. Ilda Bulica, da mesma idade, confessa que "a mala nunca se desfaz".
O rápido crescimento da economia angolana está a exigir o regresso ao país de jovens com qualificações superiores, necessários para preencher as milhares de vagas de emprego oferecidas pelas multinacionais. Só nos três dias de duração do fórum de recrutamento Elite Angolan Careers (EIC) as 38 empresas participantes ofereceram mais de 240 postos de trabalho, sobretudo nas áreas de engenharia, finanças ou recursos humanos. "Há milhares e milhares de vagas e esta é apenas uma iniciativa de recrutamento. Vamos fazer um fórum todos os anos em Lisboa; em Julho vamos estar em Luanda e em Outubro na África do Sul", afirma Miguel Vieira, da EIC, sedeada em Londres.
O Governo de José Eduardo dos Santos tem tomado medidas para garantir a presença nas empresas de cidadãos nacionais. Pelo menos 70 por cento dos quadros têm de ser naturais do país e o novo regime sobre o recrutamento na indústria petrolífera veio obrigar o sector a preencher todos os lugares com angolanos. A contratação de estrangeiros só pode ser feita com autorização do Ministério dos Petróleos.
Mas ao mesmo tempo que empresas como a Coca-Cola, a Chevron ou a Mota-Engil tentam caçar os talentos na diáspora, os portugueses também procuram novas oportunidades de trabalho em Angola. As remessas dos emigrantes atingiram os 60 milhões de euros o ano passado, segundo a estimativa de Manuel Ennes Ferreira, professor no Instituto Superior de Economia e Gestão. Um aumento de 12 milhões de euros face a 2007.
"Ao contrário dos emigrantes do pós-independência, na década de 70 e de 80, em que os quadros qualificados e semi-qualificados predominavam (a trabalhar para as instituições do Estado e empresas públicas), os actuais apresentam uma heterogeneidade maior e um direccionamento diferente", diz Ennes Ferreira. Aos portugueses com formação superior, junta-se agora mão-de-obra pouco qualificada, atraída pela expansão do imobiliário e da construção de infra-estruturas. São, sobretudo, jovens à procura de emprego. Ennes Ferreira diz ainda que há "um bom número de emigrantes que são promotores de actividades". E que o principal empregador é o sector privado, angolano ou português.
A demora das autoridades na emissão de vistos - com histórias de pessoas que passam a noite à porta da representação diplomática em Lisboa - é apontada pelos empresários portugueses como um dos maiores obstáculos. De acordo com os dados oficiais, há 59 mil inscrições activas nos consulados de Benguela e Luanda (55 mil só na capital angolana). Em 2007, estavam registados perto de 56 mil portugueses. "É previsível que sejam mais. Os portugueses entram e saem, não se inscrevem. Para além disso, as inscrições activas incluem pessoas com dupla nacionalidade", avança Francisco Borges, em missão de serviço no Consulado-Geral de Portugal em Luanda.
O fluxo migratório entre Portugal e Angola é intenso. Segundo os últimos dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, há 32.728 angolanos legalizados e à representação diplomática portuguesa em Luanda chegam, diariamente, centenas de pedidos de visto. No dia em que falou ao PÚBLICO, Francisco Borges tinha em cima da mesa 140 solicitações para dar parecer. "Na época alta, entre Maio e Outubro, chegam a ser 300 por dia", revela, acrescentando que são muitos os angolanos que, apesar das oportunidades trazidas pela prosperidade económica, continuam a vir para Portugal.
Jornal Público, aqui.